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Relativizar o relativismo

por Francisco Mendes da Silva, em 31.08.10

Um artigo do João Pereira Coutinho no Correio da Manhã acelerou a pulsação em vários recantos da blogosfera. Sem querer ser presunçoso, suspeito que terei sido um propagador decisivo das más vibrações (parece-me que foi a indignação de Fernanda Câncio e da Ana Matos Pires contra a minha transcrição do dito artigo que iniciou o contágio). Seja como for, fui repreendido (com Fernanda Câncio a insistir na indelicadeza de se referir colectivamente ao 31 da Armada, atribuindo a todos os elemento do blog os posts de cada um deles - enfim).

 

Que fiz eu? Uma transcrição e um link? Uma transcrição ou link nem sempre são um crachá na lapela de quem os faz. No caso do post infame, limitei-me a dar conta de uma opinião alheia que me pareceu interessante. Admito que os visados se possam sentir ofendidos e injustiçados (porventura, mais pelo estilo), mas também julgo que existe um fundo de verdade no pressuposto central do artigo: o fim das penas da estirpe da de morte por lapidação, no Irão, poderá depender, em última análise, de opções políticas de forças externas com cuja necessidade muitos dos que se mobilizam em manifestações por Sakineh Ashtiani não se querem confrontar. Não acho que o conteúdo ou o estilo do texto estejam fora dos limites do que é aceitável numa sociedade livre. Por que razão me haveria de censurar na citação?

 

Em princípio, eu não escreveria aquela opinião - pelo menos nos exactos termos em que o João a escreveu. Encontro mérito na manifestação de Sábado e, de resto, se dissesse o oposto, estaria a contrariar algo que ainda este ano disse na presença de alguns membros do Jugular. No dia em que Christopher Hitchens esteve na Casa Fernando Pessoa, fiz-me à A1 para me acotovelar por entre os fiéis. Felizmente, quando era já mais a multidão em pé que a sentada, uma simpática assistente indicou-me uma cadeira vazia na segunda fila. Dizia "Acompanhante de Fernanda Câncio" - o que muito me honrou e de todo me demoveu de aceitar a oferta. Depois da inspiradora prelecção do convidado, lá fiz umas perguntas, para ajudar ao debate. Uma vez que se falara do teocentrismo de alguns países e do fraco currículo dos mesmos em relação aos direitos humanos - desde logo, aos direitos das mulheres -, perguntei se não é uma ironia trágica que, no Ocidente, aqueles que supostamente deveriam ser os primeiros a denunciar a barbárie sejam, tantas vezes, os primeiros a justificá-la, em nome do respeito pelas identidades culturais. Referi, como seria natural, o caso eloquente de Germaine Greer. Hitchens respondeu que sim, que o relativismo multiculturalista tem uma força tal que consegue que, em seu nome, até a mais empedernida das feministas dê folga aos seus princípios. Nenhum membro da assistência secundou Hitchens e uma senhora particularmente exaltada atirou-se às suas credenciais para lhe criticar os apetites intervencionistas. Hitchens não se ficou e, de um momento para o outro, tínhamos ali o outro Hitchens - o falcão neo-con - de que os presentes não estavam à espera, a debitar opiniões que não se afastavam muito do âmago da do João Pereira Coutinho.

 

E isto para dizer o quê? Que acho um tanto apatetada a reacção ao artigo do João Pereira Coutinho, mas que fico contente por saber que as nossas feministas se dispõem a relativizar o relativismo para defesa dos princípios do lado de cá.


lavagem de mãos e outras medidas profiláticas

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De Carlos do Carmo Carapinha a 31.08.2010 às 10:16

Hilariante é isto: há (quase) sempre alguém que invariavelmente coloca um comentário sem a mínima relação com o tema do post.
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De PALAVROSSAVRVS REX a 31.08.2010 às 12:57

Mas isso até é divertido, Carlos.

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