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Má raça a desta gente

por Nuno Miguel Guedes, em 10.06.08

Enfim, comecemos por um pequeno episódio contado por Chico Buarque de Holanda (e registado na colectãnea celebratória dos 90 anos de Vinicius de Moraes). Estava-se em 1975, 1976 talvez. Chico e Vinicius, deslumbrados pela revolução dos cravos e sobretudo pelo futuro que lhe auguravam, cantam em Coimbra perante uma plateia de estudantes altamente politizada - mas de sentido único.

O espectáculo foi um sucesso. No final, o Poeta, com o inevitável copo de whisky na mão, vem ao palco agradecer sinceramente à «mocidade portuguesa». Resultado: os que aplaudiram vaiaram, invectivaram, sugeriram que Vinicius teria pactuado com o velho regime. O poeta permaneceu entre o estupefacto e o dístraído, sem perceber as reacções da plateia. E foi Chico que o retirou e que mais tarde lhe explicou que utilizar «mocidade» e «portuguesa» na mesma frase não caía bem perante uma turba que aclamava os amanhãs que iriam cantar.

 

Lembrei-me imediatamente deste incidente mal soube do desespero do Bloco de Esquerda aqui noticiado. Pedir explicações sobre um lapsus linguae de alguém que cresceu a ouvir a expressão «Dia da Raça» já é patético. Acreditar sinceramente que existem dúvidas sobre a filiação salazarista de Cavaco Silva não serve nem para quadra de manjerico.  Mas ser o próprio prof. Fernando Rosas a insinuar a dúvida e a transmitir a indignação, isso então já não se aguenta.

Não é por acaso que o dia de Camões era também o «dia da raça». Porque «raça», aqui, não representa características genéticas eventualmente superiores. É entendido no sentido em que era usado no século XVI, significando gesta, povo, colectivo. Está nos Lusíadas, meu Deus. É um simbolo de identidade colectiva de nação, única, individual. O regime de Salazar (ou «fascista» como lhes dá mais gozo) nos seus tremendos erros, pelo menos evitou a questão rácica a la Gobineau, talvez mesmo pelo sentido de ridiculo que isso lhe traria. Que o prof. Fernando Rosas evite essa abordagem que ele conhece melhor do que todos é prova evidente de má-fé e de desejo patético de marcar agenda. Por outro lado, sendo um cavalheiro filiado num partido internacionalista que acredita em «igualdade» sem fronteiras por oposição a «liberdade» dá-lhe atenuantes. A raça, caro professor Rosas, neste contexto somos nós - os Tugas, o Manuel Bento, o Nicolau Breyner, os taxistas, eu, o senhor. Tudo o resto é má-fé e o costumeiro arraial folclórico de argumentos. Começa a não haver pachorra, caramba. Arranjem uma vidinha, sim? Ou ponham o Skoda no Rossio. Qualquer coisa, mas tenham vergonha.


lavagem de mãos e outras medidas profiláticas

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De Henrique Morais a 10.06.2008 às 15:29

Pois era um comentario que me teria passado ao lado, a mim e a maioria descomplexada dos portugueses... Devo dizer que contribui muito mais para os nacionalismos exacerbados estas ridiculas reacçoes da esquerda moralista, do que qulaquer slogan do Estado Novo. Nunca liguei muito a este dia, mas graças ao Senhor Fernando Rosas e aos camaradas do PC, é com orgulho que reclamo um Bom Dia da Raça para todos vos...
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De al kantara a 10.06.2008 às 15:39

Caro sr. Morais, de esquerda me confesso, moralista não tanto, nessa maioria descomplexada de portugueses não me revejo e por isso acuso o toque quando oiço disparates e tontices de quem raramente tem dúvidas e nunca se engana. Quanto ao mais, um grande bem-haja para si também...
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De quatro_tempos a 10.06.2008 às 16:11

Concluindo e resumindo, que a tarde já vai alta ...

O Cavaco interessa a alguém ...?
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De Henrique Morais a 10.06.2008 às 16:18

Pois faz muito bem em acusar o toque... Tambem eu ouço constantemente coisas ridiculas e disparatadas. So nos resta respeitar a liberdade bem como a democracia e as suas consequencias.
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De al kantara a 10.06.2008 às 16:23

Exactamente, caro Sr. Morais. E respeitar a liberdade, a democracia e as suas consequências inclui exercer esse bem impagável que é a liberdade de expressão. Por isso cá estamos a prestar a devida vénia a essa liberdade que conquistámos, em vez de sublinharmos a raça ou lá o que é isso a que o senhor presidente estava a referir-se...
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De De Puta Madre a 10.06.2008 às 16:25

Eh eh eh

Somos todos Mortugueses. De etnia Mortuguesa.
E vale Mortugal!
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De qwerty a 10.06.2008 às 16:28

Li algures que anda por aí a "ASAE da Língua". AHAHAH. Bem visto.
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De blogdaping a 10.06.2008 às 16:30

Olha ..........!!!
Eles fazem da lingua o que querem.... !! lol !
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De Henrique Morais a 10.06.2008 às 16:29

Ate posso admitir que o Senhor nao goste do presidente, mas e preciso ter muita ma fe, e peço desuclpa pela observaçao, para acreditar que a dita referencia a raça possa por em causa qualquer tipo de liberdade conqusitada. O presidente pode ter alguns defeitos, mas ninca constou que tivesse qualquer inclinaçao que fossem contra a democracia parlamentar...
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De quatro_tempos a 10.06.2008 às 16:34

Sabemos nós, se o senhor tem isónias por causa disso !!
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De al kantara a 10.06.2008 às 16:47

Caro senhor Morais, garanto-lhe que não é a minha reconhecida antipatia pelo senhor professor Cavaco que me leva a reagir às suas palavras, nem tenho a má-fé de acreditar que a tal referência à raça tem motivos ideológicos. Tenho é o direito de esperar que o mais alto representante da nação não diga disparates confrangedores em público, num episódio de atrapalhação patética que vem, aliás, juntar-se a outros, e aconselharia os serviços da presidência a reunir com o chefe de estado para verem se conseguem evitar que o senhor presidente se torne protagonista de mais situações risíveis e embaraçosas. É que, bem vê, não se pode reclamar rigor só para os outros...
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De Anónimo a 10.06.2008 às 16:57

Pois voltamos a questao das liberdades... Respeito a sua opiniao, esperando tambem que nao se sinta ofendido por nao ver nas palavras do presidente, que tambem e meu presidente, qualquer provocaçao ou conotaçao xenofoba. A palavra raça foi utilizada por varias figuras da nossa historia que estao longe de qualquer ideologia "fascizante".
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De al kantara a 10.06.2008 às 17:18

Caro "Ser não identificado" : Em nada me ofende que não sinta provocação ou xenofobia nas palavras do presidente . Espero que reconheça, no entanto, que tais afirmações são imprudentes, descontextualizadas e inoportunas, pelas razões que já referi e mantenho...
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De Henrique Morais a 10.06.2008 às 17:48

Imprudentes seriam ha 30 anos.... Temos de saber viver o presente e parar de pensar em fantasmas do passado e esquecer efemerides de uma vez por todas!!! Tudo é importante no tempo em que assim teve de ser. Ou acha mesmo que existe o risco de semelhante situaçao no nosso pacato pais?
Tudo que se aproxime do campo das "conquistas de Abril", nao passa impune aqueles que se julgam seus senhores. A democracia nao e propriedade de ninguem.
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De al kantara a 10.06.2008 às 18:04

Pois meu caro sr. Morais, quando aqui há pouco tempo passei pelo Marquês de Pombal e vi um cartaz de uns rapazes que não gostam de estrangeiros nem de emigrantes, vi logo que não estava no nosso pacato país. E quando vejo manifestações mais ou menos agressivas de cabecitas rapadas (por fora e por dentro) também calculo não estar no meu pacato país. E quando vejo a situação de pobreza, exclusão social e marginalidade associada das comunidades negras de 2ª e 3ª geração, concluo logo que tal não se passa no meu pacato país onde, evidentemente, somos todos bons rapazes, não existe racismo e, portanto, o senhor presidente pode perfeitamente referir-se ao dia da pacata raça do nosso pacato país.
Já agora, concordo consigo quando diz que a democracia não é propriedade de ninguém. Mas como é de todos, todos temos o dever de zelar por ela (no nosso pacato país...)
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De Tiago Moreira Ramalho a 10.06.2008 às 17:54

Caro Al Kantara e todos os outros que estão profundamente indignados com o termo "raça" proferido por Cavaco, não sejam ridículos !

O Nuno Miguel Guedes tem toda a razão naquilo que escreveu, a "raça", mesmo no tempo do Salazar, não tinha qualquer conotação ligada à cor da pele ou à genética, tinha apenas que ver com o povo português, a "raça portuguesa" se assim o entender. É um tontaria todo este alarido que se instalou por causa de uma simples palavra. Já é tempo de viver a democracia sem o fantasma do Maior Português de Sempre, cujo nome não deve ser pronunciado (estou a ser irónico, caso restem duvidas). Chega de ter medo de utilizar termos que apenas são ofensivos para mentes perversas . Escrevi um texto sobre o assunto no meu blogue (curiosamente é o primeiro texto deste blogue) e não vejo qualquer coisa errada com o que Cavaco Silva disse. E não é por ser Cavaco, pois se Mário Soares ou Jerónimo de Sousa saíssem para a rua a dizer que o dia 10 de Junho é o dia da raça eu defendê-los-ia também. Se considera o termo "raça" neste contexto nacionalista, considerará certamente profundamente fascista haver um dia de Portugal, santo Deus que ataque à democracia e às liberdades ter orgulho na nação e na raça portuguesa!
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De al kantara a 10.06.2008 às 18:15

Caro Moreira Ramalho, dos tempos em que se comemorava o dia da Raça, mantenho memória viva e nunca tive essa interpretação benigna que lhe quer dar. Veja lá que já ao dia de Portugal nunca lhe conferi uma conotação fascista. É que, ainda por cima, Portugal existe mesmo, e Raça Portuguesa só existe nas imaginações mais ou menos distraídas (no melhor dos casos) ou mais ou menos perversas (no pior). Por isso, deixe-me ser ridículo à vontade para poder continuar a dizer que o sr. presidente perdeu uma excelente ocasião para estar calado...
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De Henrique Morais a 10.06.2008 às 18:24

Esse senhores devem representar 0,0001% da populaçao portuguesa...Nao se preocupe que nao poem em causa a "pacatez" do nosso pais.
Peço desculpa, mas ja perdi a tarde a discutir isto que, como sempre, nao tem vencedores.... Reafirmo que nao vejo mal algum nas palavras do presidente.A sua opiniao fica registada... Passe bem.
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De al kantara a 10.06.2008 às 18:37

Vou tentar, Sr. Morais, vou tentar (passar bem). Quanto à discussão, a ideia é essa, registar opiniões e argumentos e não declarar vencedores. Quanto a mim, não sinto que tenha perdido a tarde. Bem vê, detesto praia, a Espanha está a ganhar aos russos e, por uma situação especial, tinha a tarde por minha conta. Como ainda não encomendei o Skoda para estacionar no Rossio e fazer a vontade ao autor deste post, e já arranjei uma vidinha que não me dá particular preocupação, nada melhor que uma boa troca de argumentos na blogosfera...

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