por Laura Abreu Cravo, em 03.02.07
O Homem já foi à Lua; a clonagem está cada vez mais avançada; os computadores e telemóveis são, cada dia que passa, mais pequenos; o meu forno aquece a comida na hora programada sem que eu tenha sequer que estar por perto; vi, há poucos dias, uma reportagem sobre o primeiro transplante de dois pulmões feito em Portugal e garantem-me que há uma operação que posso fazer que me resolveria o raio da miopia (aquela que eu vou estoicamente tentando ignorar).
Mas nada disto me parece relevante. Porque estou de cama há dois dias. Deliro de febre, arrasto-me pela casa com dores em partes do corpo que achava que não tinha, atiro-me para o sofá exausta por ter giboiado os dois metros que o separam da cozinha onde ferve o chá de limão. O chá de limão com mel, bem quente (porque se não te passar a gripe ao menos vomitas e esqueces os arrepios de frio por 3 minutos).
E o raio da casa que, aquecida que nem uma incubadora, parece sempre gelada. Ainda assim, preparam-se as armas para combater o inimigo: na mesa ao lado do sofá o cocktail de medicamentos com tudo o que está no armário, duas caixa de lenços de papel, as “Ligações Perigosas” do Laclos, os comandos do DVD, TV e aparelhagem, o MAC e mais dois dossiers com questões urgentes para ver para um cliente.
Depois da auto-medicação da praxe e de ajeitar as almofadas preparo-me para deitar mãos ao trabalho: a febre torna a mostrar ao paracetamol que quem manda na minha testa é ela, a tosse volta a atacar e posso quase jurar que, no meio dos delírios, ouvi o nosso intelectual de direita da Marmeleira sussurrar-me que o mundo era pequeno demais para ambos os nossos blogues. Não adianta. Nem este poste escapa à ditadura do vírus. Gostava de conseguir opinar sobre coisas apaixonantes como as declarações do ministro Pinho sobre a mão-de-obra em Portugal, mas tenho a certeza que nada disso aconteceu realmente e que foi só mais um delírio da gripe. Ninguém seria tão tolo.
Agora, vou pegar em mim e nas duas mantas que tenho em cima dos joelhos, mais os setecentos lenços de papel usados espalhados por todo o lado onde passo, e vos desmaiar para o sofá entre filmes deprimentes e jornais do dia até que o efeito dos comprimidos volte e, qual paulada na nuca, me deixa fora de serviço mais umas horas. Tudo isto porque o Homem foi à lua, mas ainda não percebeu como se mata o raio do vírus da gripe. Agradeçam por mim à Nasa (ou ao Nasex).