De Zé Diogo Quintela a 05.02.2007 às 22:47
“A discussão sobre o princípio da vida acabou há vinte anos”. Acabou há vinte anos? Devia estar no recreio, quando se deu essa proclamação. E não recebi o memorando. Eu e uma data de cientistas que, nos jornais e nos blogues, debatem sobre quando é que começa a vida humana. É aquando da fecundação? É quando o óvulo fecundado se vincula ao útero materno? É quando se desenvolve o sistema nervoso? Enfim, uma série de hipóteses que já vi serem avançadas neste debate. Portanto, quando dizes “É claro que existem certezas sobre o princípio da vida”, presumo que estejas a falar das tuas.
(Ah, e dizeres que eu próprio o admito porque não uso as palavras “discórdia” ou “polémica” é muito imaginativo. Rodrigo, o facto de eu não dizer algumas palavras, não significa que tenhas que me pôr outras na boca.)
Portanto, não é só junto à Lídia Jorge que o meu ponto de vista é consensual. Por falar nisso, a referência à Lídia Jorge parece-me descabida nesta nossa conversa, uma vez que não me referi a “coisa”. É tão aceitável como comparar-te ao César das Neves, porque – e corrige-me, pois posso estar a extrapolar – parece-me que achas que a vida humana começa na fecundação e, sendo a vida humana inviolável, qualquer aborto deve ser proibido. E quem diz aborto, diz pílula do dia seguinte. Será que, depois deste referendo, independentemente do resultado, te irei ver a lutar pela abolição da lei do aborto que ficar? Seja a nova ou a antiga? É que ambas permitem matar.
Já a referência à Odete Santos é bem esgalhada da tua parte. Sempre que penso que vou votar no mesmo quadradinho que algumas pessoas com quem não partilho nenhuma afinidade (tirando ter dançado tango no mesmo palco), sou quase tentado a mudar o meu sentido de voto. Só que, do outro lado, estão os gajos do PNR e da Frente Nacional (com quem não cheguei a dançar), e volta tudo ao mesmo...
Dizes que, ao votar sim, autorizo a liberalização do aborto sem que exista o mínimo de consenso sobre a não existência de vida. Tens razão. Mas é aí que reside a nossa diferença: na dúvida, eu sou por deixar a decisão à grávida. Tu, na dúvida, optas por tomar a decisão por ela. Vês? Continuo a achar que fico mais bem servido com esta do consenso.
Nesta conversa toda, Rodrigo, acho que só concordo contigo mesmo no fim, quando dizes: “É que não existindo consenso, para legislar só temos o bom senso.” É que era mesmo aí que eu queria chegar! O bom senso. Cada qual decidir com o seu bom senso. Ah, ‘pera lá, afinal não pode ser! Só se o bom senso dessa pessoa for o teu bom senso.
Abraço
zdq
De Rodrigo Moita de Deus a 06.02.2007 às 20:22
Guardei este naco a pensar em ti: “A questão em debate no referendo não se destina a reconhecer ou a proclamar uma afirmação científica: se o feto é uma forma de vida (claro que é, embora não seja uma pessoa!)”- Carlos Fiolhais, cientista no impoluto Sim no Referendo. Claro que é uma vida. Diz o Carlos Fiolhais, esse cientista ao serviço do César das Neves. O problema é que a vida “não é uma pessoa”. Suponho que, não sendo uma pessoa, há falta de melhor, regressamos à tese da coisa.
Mas este é só um. De todos os cientistas que passaram no Sim Referendo não me lembro de nenhum que tenha ousado dizer que “não existe vida”. Posso estar enganado (é raro, mas às vezes acontece). “Existe vida, mas…” Mas não é bem um ser humano, mas não é bem uma pessoa, mas é mais um aglomerado de células. (a tese do aglomerado de células é a minha preferida). Este “mas…” que juntas à equação é só um pretexto para aligeirar a consciência. Mas é um pretexto que te leva para zonas cinzentas que tenho genuíno receio de explorar.
Enfim. Voltando à abóbora. Vida existe (dizem os teus) e está por isso formado o tal mínimo de consenso necessário para legislar. Mas, se li bem as tuas palavras o teu problema não é com a existência de vida mas “sou por deixar a decisão à grávida”. Vamos parar de andar às voltas com o assunto. Tu achas que a barriga – e o que está lá dentro - é dela, portanto. É isso? Se é, diz. Assume a coisa sem “mas…” pelo meio ou analgésicos de consciência.
É que “deixar a decisão à grávida” significa que os direitos da “grávida” prevalecem, em qualquer circunstância, sobre os direitos do “filho”. Neste caso, o meu bom senso é, por via da protecção do outro um senso comum.
Um abraço,
RMD
PS: Aceita as referências à Lídia Jorge e à Odete Santos como “ternurentas pisadelas”. Sou perdulário, mas não tanto.
De M. Mira a 22.05.2007 às 16:26
com jeitinho ainda concluem que masturbação é genocidio...
De Laura a 04.10.2009 às 00:00
Deparei-me com este debate hoje, um ano e meio depois. Não há qualquer problema. Independentemente da minha opinião que até vai de encontro totalmente com a opinião do Zé Diogo, tenho a dizer-te, Rodrigo, que "ternurenta", palavra que tentas usar como sendo um adjectivo, é uma palavra que, das duas, uma: ou foi inventada por ti, ou ouvida por ti, de alguém que aprendeu a Língua Portuguesa por correspondência (as unidades curriculares do curso vieram com toda a certezinha do Brasil). Talvez quisesses ter dito antes "terna". Dou-te o benefício da dúvida. É que na altercação entre unanimidade e consenso, a verdade é que, sendo unânime que a forma correcta de escrever o adjectivo em questão será "terna", é da mesma feita, consensual, que anda aí meio mundo a pensar que será antes "ternurenta".
De thorazine a 07.02.2007 às 22:29
"..parece-me que achas que a vida humana começa na fecundação e, sendo a vida humana inviolável, qualquer aborto deve ser proibido. E quem diz aborto, diz pílula do dia seguinte. "
Imagino eu que ao considerarem o início da via na união dos gâmetas, vão ser implementados tratamentos de fertilização forçados a toda a população feminina que tem uma vida sexual activa, devido ao facto que 75% das fecundações bem sucedidas não chegam a completar a nidação ao útero. Numa hipotética vida do zigoto, comparo o ignorar deste facto à ausência de disponibilização de cuidados médicos a um adulto. Se é vida, não vamos tratar uns como filhos e outros como enteados! :)
phenothiazine@gmail.com
Caro Zé Diogo Quintela,
Fala um cientista português com residência na Buraca. Descobri, juntamente com os meus colegas, o começo da vida. Julgamos que se efectua quando o Rodrigo Moita de Deus afirma que a vida começou. Aliás, fomos subsidiados por ele para efectuar este estudo não fundamentado. Analisámos apenas um caso mas era tão singular que foi consensual a sua veracidade.
Quero ainda alertá-lo para o facto de que a discussão sobre o princípio da vida acabou, efectivamente, há vinte anos quando Rodrigo Moita de Deus finalizou a questão com a sua opinião pessoal que foi, posteriormente, promulgada pelo nosso adorado PPM, filho de Deus.
Agradeço a atenção,
Professor Djárek Kambosa,
catedrático porque sim