por Rui Crull Tabosa, em 22.06.09
O Governo do PS andou durante 4 anos a defender grandes obras púbicas, desde o TGV ao aeroporto, das grandes auto-estradas a uma nova ponte sobre o rio Tejo.
Quem levantava dúvidas era acusado de miserabilista ou bota-abaixista.
O cúmulo do ridículo foi atingido nuns célebres cartazes do PS às últimas europeias, nos quais se reclamava “o direito ao TGV”. Lembram-se?
Só depois da estrondosa derrota de 7 de Junho, o Governo percebeu que já não tinha margem para comprometer o País com aquelas obras megalómanas, e que as tinha de adiar para depois das próximas eleições legislativas, altura em que, se o PS ganhar, a vontade dos Portugueses deixará outra vez de contar.
A agravar a situação do PS, este fim-de-semana um grupo de 28 prestigiados economistas defendeu o óbvio: é preciso parar e pensar as grandes obras públicas.
Agora já quase nenhum Português vai atrás da conversa das grandes obras e mesmo os socialistas têm cada vez menos coragem para as defender publicamente.
Acontece que, no outro dia, ouvi Manuela Ferreira Leite (MFL) dizer, a propósito do apelo dos referidos economistas, que, também ela, já antes defendera que era um erro endividar o País com obras faraónicas.
Fui confirmar. E a verdade é que, por muito que custe a comentadores situacionistas, bloggers da moda e estetas do artifício, MFL tem toda a razão.
Não acredita?
· A 14 de Novembro de 2007, em Coimbra, MFL afirmou que “não há recursos financeiros para concretizar os dois projectos”[TGV e novo aeroporto];
· A 2 de Novembro de 2008, em entrevista à TSF e Diário de Notícias, MFL disse que “uma política dirigida às obras públicas evidentemente que é boa para as empresas de obras públicas, está fora de causa, é boa para empresas de consultadoria, para escritórios de advogados”, mas “não é fomentadora de emprego”, logo esclarecendo que “Eu não sou contra as obras públicas, como às vezes se pretende dizer – sou contra o facto de se pensar que a política de obras públicas é uma política de crescimento da actividade económica, porque não é”;
· A 12 de Dezembro de 2008, em entrevista ao Semanário, MFL referiu que “o Governo deveria ter adoptado uma outra política económica. Mais de apoio e de estímulo às empresas, à inovação, à investigação, ao desenvolvimento e à qualificação das pessoas. E menos de investimento nas grandes obras públicas”, acrescentando que “o investimento público, obviamente, é importante, mas tem de ser selectivo, tem de ser rentável na óptica custo-benefício, indutor de crescimento económico e de estímulo à economia”;
· A 14 de Janeiro de 2009, em entrevista à RTP, MFL afirma que “Sendo Governo riscarei imediatamente o TGV (…) Não avançarei com o TGV porque é um investimento que tem uns custos presentes e futuros de tal forma violentos para o país que não são comportáveis com o nosso nível de endividamento”;
· A 23 de Janeiro, em Famalicão, MFL reitera: “Digo e repito: cada investimento público tem de ser ponderado e bem avaliado. Não é tempo de obras megalómanas, pois cada erro nestas opções é uma corrente a prender os nossos pés e a arrastar-nos para o abismo”;
· A 18 de Fevereiro de 2009, em Setúbal, MFL considerou ser um “erro dramático” se as pequenas e médias empresas não forem colocadas no “centro do mercado económico” e um “erro” acreditar nos “grandes investimentos públicos para o combate à crise”, uma vez que esses são “projectos para o empobrecimento do país, sem efeitos a curto prazo e que comprometem orçamentos futuros”;
· A 8 de Março de 2009, na Maia, MFL reiterou que “Quem cria emprego são as pequenas e médias empresas e quem não as apoia não está a fomentar o emprego”, frisando que “qualquer política que não siga este caminho vai ter como resultado o aumento do desemprego a níveis dramáticos”, para concluir: “É verdadeiramente dramático, se não trágico, que o Governo possa concretizar esses projectos, ainda por cima em tempo de crise. A última coisa a fazer para combater a crise são grandes investimentos públicos”;
· A 9 de Março de 2009, no Porto, MFL resistia às críticas, mantendo que “Não me vou calar mesmo que as primeiras pedras, os primeiros projectos e as primeiras iniciativas sejam tomadas sobre essa matéria, pois precisa de ser avisado de que há um empobrecimento sério do país se eles forem por diante”; e explicou: as grandes obras públicas “são investimentos com uma componente de importação pesadíssima, ou seja, servem para nos endividar mais, são projectos que têm consequências de encargos futuros pesadíssimos que ninguém sabe quais são, quando o nosso país já está com no encargo no futuro extremamente pesado, não sei com se exporta mais e ainda por cima não cria emprego em Portugal”;
Estes exemplos evidenciam que, agora, o Governo está a ir a reboque do PSD em matéria de grandes obras públicas. Envergonhadamente, é certo, mas que vai a reboque vai.
E demonstram que MFL, na altura criticada por comunistas, socialistas, bloquistas, aparelhistas e mais istas, tinha razão quando falou, antes de todos, contra a loucura do endividamento que essas obras agravam, para mais no momento de crise que hoje vivemos.
Não agrada? Paciência. Mas não é por isso que deixa de ser verdade.
É que a verdade não é de modas!