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Acredito que, para uma alma palavrosa e de vaidade exorbitante, a vida quase monástica dos juízes seja o pior dos infernos. Mas, por um lado, ninguém vai para a magistratura obrigado. E, depois, não me parece muito prudente a ideia de arranjar espaço para o ego com o pretexto - utilizado ainda há pouco no "Prós & Contras" pelo Desembargador Rui Rangel, no que é secundado por Boaventura Sousa Santos - de que a Justiça se deve abrir ao exterior, que deve ser "traduzida" e "explicada" às pessoas.
Ora, "a Justiça" já é explicada às pessoas. Nas sentenças, nos acórdãos, nos despachos, de uma forma que será certamente ininteligível para a maioria das pessoas mas que é tendencialmente a forma correcta de exteriorizar a produção das decisões, que tratam de matérias extremamente especializadas e se querem tecnicamente rigorosas.
Ideias da estirpe dos gabinetes de comunicação e assessorias de imprensa - que vêm fazendo escola na magistratura, desde o CEJ até aos tribunais superiores - são cedências ao simplismo, à lógica da turba, ao desleixo teórico, à vaidade individual.
Não é aos juízes que cabe a simplificação da sua mensagem (irremediavelmente complexa). É, quanto muito, à imprensa que cabe especializar-se (como em boa medida já faz) de modo a traduzir o que é à partida incomprensível. É isso o jornalismo.
O bom senso não pode ficar refém do senso comum. O dever de rerserva é também o direito à reserva, o direito a não ser interpelado directamente pela espuma dos dias.
Ao renunciarem a essa posição de privilégio, os magistrados estão a condicionar o seu raciocínio. Por muito paradoxal que seja, o dever de reserva dos juizes é a primeira condição da sua liberdade de expressão.