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A direita e o referendo

por Tiago Geraldo, em 12.02.07

O referendo de 1998 criou a ilusão de que o conservadorismo social ou a «direita dos valores» ainda ganhava fosse o que fosse em Portugal. Essa ilusão acabou ontem (de resto, como uma interpretação sensata dos resultados de 98 deveria tê-lo indiciado também).

Não escondo que, mesmo contra todas as previsões, tinha a secreta e ingénua esperança de encontrar entre a direita uma visão (ainda) mais desempoeirada e liberal neste debate. Houve honrosas e importantes excepções. Globalmente, porém, é facto indesmentível que a direita mais representativa não saiu de onde estava antes nem mexeu uma vírgula perante um problema em que devemos tentar assumir um certo compromisso entre a liberdade, a convicção e a repressão do estado. Compreendo e acho perfeitamente legítimo que a direita se continue a distinguir por determinadas opções sociais, culturais e morais. Mas a gestão a fazer entre essas opções e o monismo legitimador do Estado deverá ser cada vez mais judiciosa.
Ainda que a nova vaga da direita liberal se diga ela própria tributária de valores modernos e dinâmicos, é certo que a oposição entre modernidade e conservadorismo é quase sempre traiçoeira e muitas vezes injusta. Ainda assim, foi essa a fotografia que insistentemente se tentou tirar neste referendo. E para que a direita não se torne a incarnação ideal desse país irreformável e interior, é conveniente que volte a repensar-se com um discurso mais arejado e plural.


lavagem de mãos e outras medidas profiláticas

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De Claro que Nao a 13.02.2007 às 03:08

Existem 1 milhão e meio de eleitores que votaram Não e que estão órfãos de liderança politica. Penso que a grande maioria destes não votara PCP, BE ou PS. Se o Tiago quiser deita-los ao lixo, faca o favor. They are up for grabs .
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De André de Soure Dores a 13.02.2007 às 03:46

Portugal, isto é, os Portugueses pelo processo que decorreu a partir de 25/04/74 são considerados maioritária e sociologicamente de esquerda. Ao termos em conta esse mesmo percurso da história recente faz sentido que assim seja. Ou melhor, historicamente é uma análise que julgo correcta, politicamente um erro do qual ainda estamos em lenta recuperação. Por isso não entendo a ilusão de que fala. Eu pelo menos não a tive. Nem em 98 nem agora em 2007. E estive com o "Não" nas duas vezes. Este debate extravasou as tradicionais fronteiras ente esquerda e direita em Portugal, mas admito possível a sua análise. Norte (excepto o distrito do Porto pelos vistos) e ilhas mais conservadores, restante país mais liberal. Mas isto numa análise mais sociológica do que política e daí não ter havido lugar para ilusões em termos de ideologia ou posicionamento político. E quem faz a análise no sentido de associar a direita a forças de atraso ou conservadorismo a imobilismo e sinónimo de retrógrado é uma esquerda infame e distorcida, essa sim baseando-se em ideias e ideais ultrapassados e com provas dadas disso mesmo. Melhor dito esquerdas, desde aquela ainda trotskista, passando pela marxista-leninista, continuando num socialismo de características transformistas, que passa a adoptar as vestes femininas e a maquilhagem, ou seja a "third way", a tempo inteiro e acabando num certo sentido na social democracia (em Portugal, pela referência histórica já feita e percurso político sui generis, é integrável actualmente no centro-direita, ao contrário de outras realidades europeias).
Numa coisa estamos de acordo, a direita deve possuir capacidade de autocrítica, caminhar no sentido de tornar o conservadorismo liberal no paradigma da própria direita, actualizada e moderna, e o ponto de equilíbrio entre uma tendência que ainda se baseia muito na doutrina social da Igreja e uma outra puramente liberal. Num rumo, sem derivas, à modernidade, onde tradição e inovação são estruturas complementares e não antagónicas. Por ser verdade que "a oposição entre modernidade e conservadorismo é quase sempre traiçoeira e muitas vezes injusta" e para haver um recuo da maioria de esquerda sociológica, hoje em dia bastante coincidente com a esquerda política em termos de dimensão. Sem ilusões. O caminho não vai ser fácil. Sobretudo agora. Mas a meu ver este agora não se prende com o resultado do referendo de domingo passado. As origens são anteriores. Mas os melhores desafios não são aqueles que são mais difíceis? Pelo menos a vitória, quando acontecer, terá outro sabor... Mas para isso urge a prática da autocrítica, reconhecer e aprender com os erros cometidos e solidificar uma visão estratégica para o Estado e para a Nação.
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De Daniel MP a 13.02.2007 às 12:37

Só por tradição e economia de uso de instrumentos discursivos já testados compreendo as contínuas referências a um esquerda (e a uma direita), seja política ou social.

Enquanto nos pensarmos politicamente como tendo que ser de direita, optando depois se moderna ou conservadora (o ser-se moderno foi vanguarda até meados do século XX, diabo...), se liberal ou de expiação cristã, imputando aos outros (os de esquerda) semelhante esquema de determinação, não é exercício assim tão distinto daqueloutro, o de esgravar à vara linhas rectas em planos de saibro, assim como quem fixa fronteiras africanas.

O tempo está a passar, agora mesmo, enquanto os afilhados do 25 de Abril se protegem e os filhos dos Senhores de ontem renovam vinganças prometidas.
Distraiam-se com o tempo que passa.Não lhe tomem a substância, e depois ai ui ai ui ai ui.

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