por Francisco Proença de Carvalho, em 07.09.09
Achei extraordinária a fotografia dos jornalistas da TVI no Expresso com expressão de crianças amuadas, apresentando-se como mártires da liberdade de expressão em Portugal.
Se provas faltavam para considerar os Media como o 1.º poder, esta é inequívoca. Ao abrigo de uma suposta liberdade de informação e expressão permitiu-se que um programa de entretenimento, simpaticamente, chamado de Jornal, perdurasse durante anos a transmitir semanalmente sob a capa de notícias uma inquisição pública sobre cidadãos comuns, classes profissionais, empresas e políticos… Tudo isto, praticamente sem regras e com uma pivot/juiz a não se coibir de aplicar, com enorme indignação, a sua implacável sentença condenatória. Depois, quando, finalmente, quem paga o ordenado a estes senhores diz “Basta”, logo se levantam vozes indignadas a pregar que está em causa a liberdade de expressão/informação em Portugal. Como é óbvio, não está!
De facto, os valores deste país andam completamente trocados. Confunde-se liberdade de expressão/informação com histeria populista jornalística; confunde-se jornalismo de investigação com jornalismo puramente justiceiro; aceita-se como normal que uma pessoa, aproveitando-se de um meio de difusão tão amplo, faça um jornal em torno de convicções pessoais. Por fim, vamos ao ponto de considerar que quem tem milhões investidos numa empresa, deve abdicar dos poderes de direcção e gestão, nomeadamente quando está em causa uma forma, no mínimo, tão peculiar de fazer jornalismo. Convém relembrar que a TVI não é um blog ou um canal de comédia… Também não é suposto ser um feudo. À TVI foi atribuída uma licença como canal generalista, pretendendo-se, naturalmente, que o principal jornal do dia seja um exercício sério e imparcial.
O que me parece verdadeiramente surpreendente é que aquele tempo de antena tenha durado tanto tempo em claro prejuízo das mais básicas regras deontológicas. Naquele espaço “informativo” sentenciaram-se como pedófilos, cidadãos que acabaram absolvidos pela Justiça; nas mãos daqueles investigadores policiais sem carteira, carimbaram-se sumariamente pessoas de corruptos, sem sequer lhes permitir exercer condignamente a sua defesa em igualdade de armas. Muitos bateram palmas a estes julgamentos públicos ao bom estilo medieval. Pessoalmente, penso que isto representou uma deturpação do que deve ser o exercício de função tão nobre como o jornalismo e da liberdade de expressão e opinião (se é que é suposto saber-se a opinião de um pivot). A verdadeira liberdade só existe, quando não é permanentemente abusada por quem, bem sabendo o poder que tem de formar convicções pela vastíssima audiência que tem ao seu dispor, abusa desse poder...
Não faço ideia quem da Media Capital tomou a decisão de suspender o programa de Manuela Moura Guedes. Mas quem o fez, teve coragem, muita coragem. Nem todos a têm quando se trata, muito provavelmente, de trocar share por jornalismo.