por Vasco Campilho, em 25.09.09
Exactamente três meses antes das eleições legislativas, escrevi isto no Expresso:
(...) Com José Sócrates, o PS evoluiu de partido-âncora da esquerda para partido-charneira entre uma esquerda radical em forte crescimento e um centro-direita de regresso ao seu nível eleitoral habitual. Essa mutação tornou possível o PS dominador de 2005, mas originou um desenraizamento eleitoral que se está a reflectir, já em 2009, numa considerável quebra do apoio popular aos socialistas. A posição de charneira teve também o efeito de transportar para dentro do partido as grandes clivagens do sistema político português, elevando em muito os riscos de cisão. O centro do sistema partidário português encontra-se portanto ocupado por um partido eleitoralmente enfraquecido, politicamente dividido e organicamente instável. Se porventura ele vier a ser de novo o partido mais votado, iniciar-se-á o ciclo político mais turbulento que Portugal conheceu desde a década de 70. Definitivamente, a governabilidade já não é atributo que o PS possa reivindicar para si.
Chegados ao último dia de campanha eleitoral, o que resta desta análise?
- O PS evoluiu de partido-âncora da esquerda para partido-charneira: confere. O Partido Socialista está claramente a fazer campanha em duas frentes, e em qualquer dos cenários eleitorais expectáveis (incluindo a derrota) encontrar-se-á em posição pivotal no próximo Parlamento.
- Essa mutação originou um desenraizamento eleitoral que se está a reflectir numa considerável quebra do apoio popular: confere. Nenhuma sondagem coloca o PS a menos de 5% do nível que atingiu em 2005.
- O centro do sistema partidário português encontra-se ocupado por um partido eleitoralmente enfraquecido, politicamente dividido e organicamente instável: apesar de se ter notado uma série de movimentações no sentido de encontrar soluções alternativas a Sócrates no imediato pós-europeias, a verdade é que o ainda Primeiro-ministro soube utilizar a dinâmica de campanha para travar as forças centrífugas e recriar uma sensação de união dentro do PS. Mas as divisões poderão ressurgir no período pós-eleitoral, quer em caso de derrota, quer em caso de vitória curta. Será esse o momento de aferir se este ponto confere.
- Se porventura o PS vier a ser de novo o partido mais votado, iniciar-se-á o ciclo político mais turbulento que Portugal conheceu desde a década de 70: esperemos não ter de vir a conferir. Duas das condições que me levaram a fazer esta predição - divisão estratégica interna, desgaste da liderança - permanecem. A terceira - dificuldade em fazer coligações e entendimentos - parece mais em aberto, atendendo ao comportamento dúbio do Bloco de Esquerda relativamente à possibilidade de um entendimento pós-eleitoral com o PS de José Sócrates.
- A governabilidade já não é atributo que o PS possa reivindicar para si: confere. Em qualquer cenário de derrota do PS este retém a capacidade de bloquear a governação, mas nenhum cenário de vitória lhe permite assegurar um governo estável. Votar PS não tem portanto interesse algum do estrito ponto de vista da garantia da governabilidade.