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WikiLeaks, Guantánamo e um elogio ao Governo

por Luís Filipe Coimbra, em 16.12.10

    

Desta vez o Governo tem carradas de razão em se indignar.

E passo a explicar porquê.

1) À luz do direito internacional e, para o caso em questão, nas leis que regem a Organização Internacional da Aviação Civil (ICAO) - organismo da ONU - não existe qualquer disposição que obrigue (ou sequer recomende) a qualquer Estado Membro, saber a identidade ou a situação de todos os passageiros que passarem em trânsito pelos seus aeroportos ou sobrevoarem o seu espaço aéreo.

2) À luz do mesmíssimo direito internacional (consubstanciado para a aviação nos Anexos da referida ICAO), qualquer Comandante-piloto de um avião tem o direito de alterar o seu plano de voo submetido (por razões técnicas de gestão de tráfego aéreo) a qualquer "Região de Informação de Voo" (FIR) de um Estado. Para que tudo isto fique perceptível: se um "plano de voo" de um qualquer jacto executivo tiver origem, por exemplo, em Ciampino (Itália), com escala em Santa Maria (Açores) e destino a Nova York (EUA), nada impede esse Comandante-piloto de em pleno voo informar - e por estritas razões técnicas, repito - uma "FIR" (de Santa Maria ou da nossa vizinha "FIR" de Nova York) de que afinal não vai para lá, mas para Guantánamo, Punta Cana ou para qualquer praia das Caraíbas. 

3) Assim sendo, e como a "WikiLeaks" divulgou supostamente uma "mensagem" do Embaixador dos EUA em Lisboa a "solicitar" ao nosso Governo passagem de prisioneiros da guerra do Afeganistão pelos nossos aeroportos, só posso encontrar dois motivos para tão insólita  mensagem: ou o Senhor Embaixador estava com um copito a mais, ou então não tinha a menor noção do que seja o Direito Aéreo (hipótese mais provável).

4) Durante os anos 90, por razões profissionais e na minha qualidade de membro da Comissão Nacional de Facilitação e Segurança do Transporte Aéreo (a chamada  "FALSEC", integrando representantes da Força Aérea, PJ, GNR, SEF, PSP, etc) chegaram ao nosso conhecimento dois factos: de um avião da "Cubana" que escalava em trânsito o aeroporto da Portela, tinham fugido do Ilyushin dois cubanos que após saltarem a vedação do aeroporto tinham desaparecido na noite de Lisboa; foi-nos dito, embora informalmente, que os tais dois cubanos iam de regresso a Cuba na condição de presos por serem "perigosos deliquentes" - razão pela qual as autoridades policiais tinham de os encontrar e "devolver". Mas nessa altura nem os Cubanos tiveram a lata de invocar o "direito aéreo internacional", nem ninguém se lembrou de acusar o Governo por "deixar passar" presos pelos nossos aeroportos!

5) Como este episódio até apareceu (embora como "pequena notícia" e sem pormenores), em alguns jornais portugueses e a tal "esquerda moral e dos direitos humanos" nada disse ou criticou então, só podemos hoje confirmar aquilo que a maioria dos portugueses já percebeu: 

há gente que em política continua a ter "dois pesos e duas medidas", que "todos os meios justificam os fins".

Traduzindo estas ideias para trocos políticos: tudo o que é anti-americano, é bom!!! 


lavagem de mãos e outras medidas profiláticas

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De Anónimo a 17.12.2010 às 01:04

Alguém consegue imaginar uma presidências abertas e uns roteiro poéticos em banquetes com chefes de estado em que depois da sobremesa e do café alguém grita e diz, está na hora, e começam-se a distribuir aos monarcas, chefes de estados e suas eminências, caçadeiras para tiro aos pratos no Monsanto e canas de pesca, anzóis e asticots ou minhocas para quer tiver preferência numa pescaria na Cruz Quebrada. 
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De awsed a 17.12.2010 às 01:19

será que não há outras regras para a aviação militar? o lfc começa o artigo a falar das regras vigentes na aviação civil.
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De Oscar Alho a 17.12.2010 às 06:33


a argumentação é um bocadinho "FALSEC"!
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De Isabel Moreira a 17.12.2010 às 10:08

Esta questão está a permitir que se discuta em blogues, de forma muito sucinta, bem como na comunicação social, questões altamente técnicas. O que escreve sobre o regime jurídico do passagem aérea de voos só é, em parte, verdade. não consigo explicar aqui tudo nem quero porque precisaria de escrever um pequeno/grande ensaio que distinguisse voos civis (os do seu texto) de voos militares afectos a uma operação; que distinguisse sobrevoo apenas de sorevoo com aterragem. Se um voo quisesse usar as lajes ao abrigo do acordo que temos, com detidos para serem libertados ou para o que quer que fosse, teria de haver uma notificação na qual constaria a lista de passageiros. A operação em si tinha de ser negociada - e houve negociações para ajudar a encerrar aquela coisa que é o centro de detenções de Guantanamo - apresentando Portugal a lista de garantias jurídicas a serem observadas - o que aconteceu em negociações informais - e se os EUA realmente entendessem por bem concretizar um voo com esse objevtivo teriam de nos fazer um pedido concreto. Ora, nunca foi feito. No que ao Estado português diz respeito, o voo nunca aconteceu. Uma pena. Teria sido óptimo que para além de receber detidos de Guantánamo tivessem sido reunidas as condições para autorizar o uso das lajes, caso a caso, com garantias jurídicas para repatriar/libertar gente presa sem motivo . 
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De Carla a 17.12.2010 às 17:40

O Isabel, gente presa sem motivo? Como sabes?
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De Luis Melo a 17.12.2010 às 13:20

Depois de ter publicado documentos que embaraçaram Estados, Governos e Políticos… Depois de ter publicado documentos que colocam em causa a segurança de várias nações… O wikileaks lançou agora um documento que pode por em causa muito mais, e que pode mesmo ter consequências gravíssimas… o documento lançado identifica o Super-homem como sendo o jornalista Clark Kent, e o Batman com sendo o empresário Bruce Wayne.


Correm também rumores, em Portugal, que a organização de Julian Assange terá documentos em sua posse que revelam a verdadeira identidade da Leopoldina, da Popota e de outras figuras proeminentes da sociedade portuguesa. Desconhece-se para já a dimensão do impacto que estas revelações podem ter no nosso país, já assolado pela crise financeira, económica e social.
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De FNV a 17.12.2010 às 22:29

A Isabel Moreira assinala  o carácter dos voos, mas , tanto quanto sei, os da CIA são civis.
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De anónimo a 18.12.2010 às 04:33

Caro Luís Filipe, 


Concordo, em grande parte, com muito do que disse.
Faço-lhe apenas uma ressalva, a Convenção de Chicago aplica-se apenas e só a aeronaves civis e não a aeronaves propriedade do Governo, ao serviço do governo (alineas a), b) c) e d) do artigo 3.º da Convenção de Chicago). Segundo este artigo, nenhuma aeronave de estado pode sobrevoar o território de outro estado contratante sem autorização outorgada por acordo especial e em conformidade com as regras por ele impostas. 


Assim sendo, mesmo que o plano de voo fosse para o território continental americano e já na FIR de NY o Cmdt. decidisse alterar o plano de voo não deixaria de constituir uma grave violação das normas internacionais de direito aéreo, de soberania dos estados e da diplomacia entre países aliados. 


Obviamente, se a CIA quiser transportar quem bem entender através do território nacional sem que ninguém tenha conhecimento fá-lo-á, servindo-se de estratagemas semelhantes ao que referiu. Aí concordo consigo.


Mas a mesma facilidade já não existirá se quisermos pernoitar num hotel do Porto, desembarcando o "passageiros" e levando-o para um hotel na cidade. 


Se fez parte de comissões FALSEC explicar-me-á, por exemplo, como é que é feita alfandega / controlo de fronteiras em Base Aéreas? Se uma aeronave aterrar em LPPT e for aeronave de estado/militar e os "pax's" desembarcarem por Figo Maduro onde é que existe controlo?
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De Luís Filipe Coimbra a 24.12.2010 às 18:32

Meu caro anónimo,
1) Não vejo onde uma alteração de um plano de voo, em pleno voo, de um avião registado nos EUA, da FIR de NY (EUA) para Guantánamo (EUA), possa constituir uma afronta ao direito internacional.
2) Para meu descanso (e suponho que também para o seu), qualquer passageiro, militar ou civil, mesmo que desembarcado no "Figo Maduro" e que queira entrar em território nacional é sempre objecto de identificação prévia pelo SEF e a sua bagagem vistoriada pela Alfândega! 
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De Fly_Boy a 18.12.2010 às 04:39

Atenção que os Anexos da ICAO não vigoram na Ordem Jurídica Interna. 


Os Anexos da ICAO (salvo um ou outro, ex. Anexo 14) nunca foram transpostos para o direito nacional, publicados em língua portuguesa etc.


E mesmo aqueles, poucos, que o foram estão altamente desactualizados. 


Os anexos da ICAO valem tanto como as CIAS (Circulares de Informação Aeronáutica) do INAC...são um mero instrumento de orientação do sector e não têm qualquer obrigatoriedade. Vinculam o estado portugues internacionalmente mas não podem ser impostos a 3.os sem que sejam devia e correctamente transpostos para  a OJ nacional.

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