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Trinta e três anos de engodo

por Rodrigo Moita de Deus, em 27.04.07

Durante trinta e três anos deixámos que a esquerda definisse as regras pelas quais a comunicação social se deveria governar. Deixámos que a esquerda estabelecesse o que é bom e mau jornalismo. O que é aceitável e reprovável eticamente. Deixámos que a esquerda implementasse  esse extraordinário conceito da "isenção". Conceito descrito e regulado por sindicatos, colégios deontológicos e entidades reguladoras controladas por “isentas” figuras de esquerda.

 

Pina Moura tem alguma razão. Na maior parte dos casos os projectos de comunicação social são projectos políticos. Nas origens da imprensa não estão as gazetas informativas sobre a vida da corte mas a propaganda jacobina dos panfletos contra Luis XVI. Nesse sentido a “isenção” é novidade própria do caso português. A “isenção” foi apenas o pretexto para a nossa esquerda nacionalizar, sanear e tomar de assalto as redacções no período pós 25 de Abril. E a direita, ingénua, foi na conversa. Ingénua, continua a ir na conversa.

 

Os tempos entretanto mudaram. Temos um mercado de media. Um mercado - condicionalmente - livre de informação. Nestes tempos, a “isenção” é uma opção do gestor. Um jornal desportivo pode decidir ser “benfiquista” para vender mais. Uma televisão pode decidir ser mais populista para aumentar as audiências. Nem sequer é uma opção do editor. O editor é escolhido consoante a linha editorial pretendida pelo gestor. Se quiser um jornal benfiquista, irá buscar um editor benfiquista. Se quiser uma televisão socialista, irá buscar um editor socialista. É o mercado a funcionar.

 

A esquerda percebeu bem as ameaças e oportunidades deste novo jogo e soube adaptar-se Antes mesmo do caso Pina Moura, não nos podemos esquecer que foi também um governo socialista a incentivar a compra da Lusomundo pela Portugal Telecom.

 

E o que faz a direita? Adapta-se? Claro que não. Ingénua repete um discurso com trinta anos. Reclama “isenção”. Isenção nos media públicos e (pasme-se) isenção nos media privados. Discurso que esbarra nas regras de mercado que a direita (supostamente) defende. O accionista tem direito a escolher uma estratégia e os melhores funcionários para a executarem.

 

No caso prático, é claro que eu não gosto da nomeação de Pina Moura para a Media Capital. Não gosto porque tenho inveja. Preferia que fosse um dos nossos.


lavagem de mãos e outras medidas profiláticas

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De Ricardo Duarte a 27.04.2007 às 16:45


Não deve estar lembrado do processo de entrega de licenças às TVs privadas e os seus pressupostos. Do seu texto também se depreende que as entidades reguladoras não servem para nada…é deixar o mercado andar…não me parece que seja assim tão simples.

Não me diga que não acredita que não se consegue ser – minimamente – isento.

Ps: não é por o discurso ter 30 anos que está errado. Se calhar 30 anos ainda não chegaram para acabar com os vícios todos de esquerda. Alias, parece é que cada vez está pior.
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De Rodrigo Moita de Deus a 27.04.2007 às 17:58

Caro Ricardo,

Estas entidades reguladoras não servem mesmo para nada. E porquê? Porque você está a regular aquilo que não é possível regular: "o grau de isenção". Regular a isenção dá para tudo, especialmente dá para não fazer nada.
Mas isso não quer dizer que o mercado não precise de regulação. Claro que precisa. Mais do que regulação, precisa de intervenção em matérias tão simples como o cumprimento dos contratos de concessão...por exemplo.

Eu não digo que os jornalistas não conseguem ser isentos (embora tenha dúvidas), o que eu digo é que não é preciso pedir-lhes isso.

um abraço

RMD
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De Miguel Alpoim a 27.04.2007 às 16:45

A primeira opinião lúcida sobre este caso.
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De Luis Oliveira a 27.04.2007 às 16:49

«Deixámos que a esquerda estabelecesse o que é bom e mau jornalismo. O que é aceitável e reprovável eticamente. Deixámos que a esquerda implementasse esse extraordinário conceito da "isenção". Conceito descrito e regulado por sindicatos, colégios deontológicos e entidades reguladoras controladas por “isentas” figuras de esquerda.»

Rodrigo:

Discordo de algumas das coisas que diz neste artigo. Sobre a passagem que cito diria o seguinte: não confiro nem desminto, mas quando vejo o clube de jornalistas sinto-me tentado a concordar.

Uma coisa é certa em contextos diferentes vejo grupos diferentes adoptarem um discurso de vitimização. Serei só eu a achar que isso acontece tanto à esquerda como à direita?

Quanto ao papel do mercado acho que estamos todos de acordo (uns mais outros menos, mais uma vez dependendo das circunstâncias). Pelo menos já ninguém defende abertamente que a propriedade dos meios de comunicação deve estar entregue ao Estado.
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De Rodrigo Moita de Deus a 27.04.2007 às 18:13

Luís,

Tem toda a razão. Todos se queixam. Depende de quem tem o poder. Mais. Num país onde a economia é quase totalmente dependente do Estado os grandes grupos privados de comunicação social serão - regra geral - subservientes - por opção própria - ao poder. seja quem for o poder.

Mas isso são outras contas. O meu ponto era com a tradição de "isenção". É claro que a direita teve Marcelo Rebelo de Sousa e Paulo Portas nos jornais. Mas eles sempre foram vistos como "políticos a fazer jornalismo". Diana Andringa, Ruben de Carvalho ou mesmo José Saramago, sempre foram jornalistas que - de quando em vez - até faziam política. A diferença é significativa.
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De Luis Oliveira a 27.04.2007 às 19:21

Rodrigo:

Dizer que o Ruben de Carvalho é um jornalista que "de quando em vez" até fazia política, remeter-nos-ia para uma longuíssima discussão sobre se a natureza da direcção do "Avante!" é política ou jornalistica.

Deus me livre e guarde!

Ainda acabávamos a discutir se a censura (antes do 25 de Abril) era uma actividade política ou jornalística!
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De VHT a 27.04.2007 às 19:28

Como é que dizia a moção Rodrigo?
"Toda a gente sabe que a comunicação social está contra nós. Toda a gente. Sempre esteve. Desde setenta e quatro que os socialistas controlam a coisa. “Eles são muito bons nisso”."
Era qualquer coisa assim não era? Na moção era ironia, aqui é a sério. Em que ficamos?
Cumprimentos
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De Rodrigo Moita de Deus a 27.04.2007 às 19:56

Caro VHT,

o texto da moção, e este, são dois registos diferentes para dizer a mesmíssima coisa: em vez de lamúrias que tal fazerem pela vida?
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De JPF a 27.04.2007 às 23:15

Excelente, "as usual" !
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De E o resto é como tudo a 28.04.2007 às 02:15

Está escrito nas trovas do Bandarra que viria um agente de Castela tomar conta da informação:

E a moura parideira
Que até pina enxuta
Vai sentar na cadeira
Um novo filho da puta

Já veio de Moscovo
De Castela vem agora
Pra lixar graúdo e povo
A todos sem demora

Trinta dinheiros pra Anadia
E o resto é como tudo
Uns favores à burguesia
E ao engenheiro sem canudo


Gonçallo Eannes, sapateiro


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De samir.machel a 29.04.2007 às 13:59

Quem será que tem definido os critérios de informacao, a esquerda ou o centrao?
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De Nuno a 29.04.2007 às 18:26

é curioso toda esta treta contestação ou protestos porque Pina Moura vai presidir a TVI, quando as licenças foram dadas ainda se lembram do processo durante os anos de governo do actual presidente da republica?

TVI, houve discussão na assembleia da república para que a igreja recebesse de mão dada sem concurso publico a licença para ter um canal tv , que veio a ganhar. Igreja que sempre esteve e continua a estar ligado à direita. Alguns anos (poucos) foram obrigados a vender porque so dava prejuizo.

SIC, projecto liderado por um antigo primeiro ministro no PSD.

Parece-me que nessa não houve ninguém a criticar com tanto ênfase o facto de todas as cadeias ficarem ligadas ao governo PSD ou à direita. Hoje pergunto-me que moral têm os políticos do PSD virem criticar o facto de Pina Moura deixar a politica para tomar conta de uma televisão?

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